20 de novembro de 2008

Um bolo para pensar


Hoje tive a fantástica oportunidade de ter sido chamado idiota por ter oferecido um bolo a uma criança que chormingava comida. Idiota porque nunca devia ter feito aquilo, de acordo com a pessoa que, a rir, me achou inocente por ter caido na "esparrela". Devia ter dado pão e mais nada.
Agora ouso eu dizer, pão, e seco!!! Sim, porque quem não tem capacidade financeira para se sustentar com dez anos de idade e tem a infelicidade de ser abusado por quem mais o devia proteger não merece mais do que isso!
Imaginem a lata, bolos...
Entendo que é impossível curar todos os males ou ajudar todos os que precisam mas, pensemos no seguinte:
Eu e o leitor (está a ver isto na net não está?), sentimos necessidade de ir ao cinema, tomar um café, comer crepes de chocolate até enjoar, e muitas outras coisas para fugir um pouco das nossas vidas.
Eu que saio da minha casa, entro no meu carro, venho para o meu trabalho, como e bebo conforme preciso e/ou quero, volto para casa abrigado, quente e confortável, onde vou jantar na minha cozinha, ver o meu LCD, sentado no meu sofá... And so on and so on. É cansativo por os possessivos a negrito.
Se nós que tanto temos (comparativamente) precisámos de um bolo, um cinema, um café, o que for, não precisará de mais que um pão seco quem nada tem? Será justo? Haverá o direito de dizer: "pão, que se ele tiver fome come"? Não necessitará alguém com uma existência triste, degradante pelos mais básicos padrões do que consideramos humano, direito a um bolo?
Ao negar esse bolo, esse brinquedo, essa bola, essa tábua de sobrevivência que pode bem ser o apogeu de sabe lá deus quanto tempo de uma imensidão de nada, estámos a trair a própria base que nos humaniza.
Custa-me sentir que possamos ser tão frios.
São atitudes que surgem através da insensibilidade do coração ou da letargia da cabeça, não pensámos ou não sentimos. Nenhum dos dois me satisfaz.
Podiamos ser mais do que somos.

18 de novembro de 2008

Amanhecer


Engraçado como nós deixamos de conseguir dizer certas coisas com o tempo.
Acho que inerente ao processo de crescimento, vem um de afastamento em relação a tudo o que é incondicional.
À medida que a sociedade nos vai dizendo para sermos homens, diz-nos também que temos de ser independentes, muito antes do o querermos ser na realidade, homens ou independentes. Vamos então criando uma ponte com alicerces muito fracos em relação àqueles que nos permitiram crescer. Não o queremos fazer mas não o conseguimos evitar.
Porque nos é tão difícil dizer a alguém que durante anos foi a concretização de todas as alegrias, a protectora de todos os males, a rocha que não mexia e a água que embalava, o refúgio, a causa de uma indescritível alegria e realização, amo-te? Porquê?
Crescemos e perdemos o direito a essa paz, crescemos e negámos o reconhecimento de termos sido tudo quando ainda não éramos nada a quem mais o merece saber.
A ponte cresce e com ela os inexoráveis traços do tempo marcam linhas desconexas que podem nunca ser ligadas.
Lado a lado com a impossibilidade de nos sentir-mos seguros e crianças, no fundo o que qualquer adulto quer, vem a incapacidade de admitir que já o fomos e a quem o devemos.
Não está correcto.
Quero ter filhos, espero passar horas a vê-los dormir, incapaz de lhes falar porque qualquer palavra é insuficiente para o momento e, qualquer um a pode proferir, não tocar porque nenhum toque transmite a realidade, é só um toque, ser o momento maior do que eu, do que tudo, absorto numa respiração que não é minha, dar-lhes nesse momento, tudo o que recebi.
Obrigado Mãe.